A diferença entre “Leis” e a “Lei” no Antigo Testamento

No Antigo Testamento, “lei” designa a vontade revelada de Deus. Mas como podemos distinguir entre os Dez Mandamentos e as outras legislações mencionadas na Bíblia?

O termo hebraico torah, geralmente traduzido como “lei”, expressa a totalidade das instruções de Deus para Seu povo: leis relacionadas a questões civis, bem como instruções morais e cerimoniais. Em Israel, não havia uma Torá moral versus uma Torá cerimonial. Existia apenas uma Torá, incluindo tudo aquilo que se relacionava à questão moral, religiosa e litúrgica.

Entretanto, o Antigo Testamento atribui um papel especial aos Dez Mandamentos dentro do seu sistema legal.

1. Têm proeminência no Pentateuco. Quando a aliança foi instituída, as primeiras exigências legais para o povo estavam contidas nos Dez Mandamentos (Êx 20). Isso não foi um acidente. Encontramos o mesmo fenômeno em Deuteronômio 5.

2. Foram proferidos por Deus. Esse é o único caso em todo o Pentateuco no qual Deus proclama diretamente uma lei para Seu povo sem a mediação de Moisés. Os israelitas ouviram Sua voz no Sinai, e ela provocou uma impressão indelével neles (Êx 20:18-20). Isso indica a singularidade dessa lei e sua primazia dentro dos códigos legais de Israel.

3. Foram endereçados a cada israelita. Quando proclamou os Dez Mandamentos, Deus falou a cada israelita, usando o pronome “você”. Cada um seria responsável em preservar e obedecer aos mandamentos, trazendo desse modo o relacionamento da aliança para um nível pessoal. Por meio de Moisés, os outros códigos legais foram dados ao “povo de Israel” (Êx 20:22; 21:1).

4. Foram gravados em tábuas de pedra. O próprio Deus escreveu esses preceitos (Êx 31:18; 32:16; 34:1), diferentemente de todas as outras leis, o que chama atenção para a singularidade do Decálogo. Aquilo que Deus falou e escreveu era uma unidade completa em si mesma (Dt 5:22).

5. São atemporais. Os Dez Mandamentos são imperativos divinos para ser obedecidos sob qualquer circunstância, não estando limitados a um período histórico nem a determinada cultura. Ao contrário das leis que regulamentavam o sistema sacrificial, o Decálogo não tinha prazo de validade.

6. Fundamentam todas as outras leis. O Decálogo é o fundamento das demais leis bíblicas. Em Êxodo 20, ele aparece como um guia interpretativo das demais leis. O mesmo também é verdade com respeito a Deuteronômio 5. Esse capítulo não resume aquilo que foi dito antes, mas é um sumário do que segue.

7. Possuem um nome específico. Entre o corpo de dispositivos legais, apenas os Dez Mandamentos possuem um nome próprio. De acordo com Êxodo 34:28 e Deuteronômio 4:13 (cf. Dt 10:4), eles são chamados de “dez palavras”. Ao dar um nome aos mandamentos, o escritor bíblico está enfatizando a singularidade dessa lei.

8. Foram colocados dentro da arca da aliança. De acordo com Deuteronômio 31:26, as leis escritas por Moisés foram colocadas no tabernáculo, “ao lado da arca da aliança do Senhor”. Somente o Decálogo foi colocado dentro dela (Dt 10:5).

É claro que o Antigo Testamento faz uma distinção entre os Dez Mandamentos e o restante dos dispositivos legais encontrados ali, conferindo ao Decálogo propósito e importância únicos. São os Dez Mandamentos que, na nova aliança, Deus quer escrever no coração e na mente dos fiéis (Hb 8:10). 

ÁNGEL MANUEL RODRÍGUEZ, pastor, professor e teólogo aposentado, foi diretor do Instituto de Pesquisa Bíblica

SEM COMENTÁRIO

DEIXE UMA RESPOSTA